Voltar para o Haiti? Não, obrigado

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Se um incêndio destruir totalmente a casa dos seus vizinhos, você os acolheria na sua casa por algum tempo? Provavelmente a resposta seria sim. Mas e se eles quiserem ficar na sua casa só porque eles acharam a sua casa mais bonita que a deles, ainda assim você os aceitaria? Bom, neste caso a resposta provavelmente seria não.

Não exatamente uma crise humanitária

Isso é mais ou menos o que está acontecendo atualmente com os haitianos que pedem asilo no Canadá.

Eles não estão fugindo de uma uma guerra. Eles não tem estão fugindo de uma epidemia. Eles não estão fugindo de uma catástrofe natural. Eles não estão fugindo de um regime político que ameaça e os persegue. E além de tudo, a vida deles não estaria em perigo se eles retornassem ao seu país de origem.

Eles não querem mais retornar ao Haiti e preferem viver no Canadá.

Quem pode criticá-los?

Você acha que Dany Laferrière estaria pronto a deixar os salões climatizados da Academia Francesa para voltar a viver em Port-au-Prince? E o que dizer de sua Majestade Michaëlle Jean? Certamente que não, e eu não os culpo! Eu provavelmente faria a mesma coisa.

Voltar para o Haiti? Não, obrigado!

Para aqueles que perderam o bonde da história, vamos voltar ao começo, quando essa “crise” começou.

Depois de um terremoto que devastou o Haiti em 2010, Barack Obama assinou um estatuto de proteção temporária àqueles que solicitassem asilo. Esse estatuto lhes permitiria viver e trabalhar legalmente (temporariamente! Lembre-se disso) nos Estados Unidos.

Há cerca de 3 meses, Donald Trump anunciou que estaria revogando esse estatuto especial aos refugiados haitianos em janeiro, afirmando que eles já poderiam retornar ao seu país visto que a situação por lá já estaria “estabilizada” (o que de fato é verdade).

Voltar a viver no Haiti, um dos países mais pobres do planeta, depois de ter saboreado o conforto norte-americano durante sete anos? “Não, obrigado”, responderam os refugiados haitianos.

Ao invés de retornar ao seu país, eles decidiram deixar o país de Donald e vir para o nosso.

O problema é que há alguns anos, o Governo Harper também havia cancelado o estatuto de proteção temporária ao refugiados haitianos, sobre o pretexto de que as condições haviam melhorado no Haiti. Ou seja: nós fizemos a mesma coisa que o Trump está prometendo!

A maioria dessas pessoas não estão fugindo de guerras, de catástrofes naturais, nem de um regime sanguinário. Todas essas condições aceitáveis para pedir asilo no Canadá. Portanto, elas terão que retornar ao seu país.

Maus anfitriões

Enquanto esperam uma resposta do Governo, aqueles que solicitaram asilo e que atualmente vivem em Lacolle e no Estádio Olímpico se queixam das condições que tem que viver.

Eu não quero parecer insensível e sem coração mas, você atravessou ilegalmente a fronteira. Você baseia seu pedido em um estatuto vencido e que provavelmente será recusado. Um estádio foi transformado as pressas para que nem você nem sua família fiquem na rua. O Governo lhe oferece atendimento médico e social. O prefeito de Montreal lhe acolheu calorosamente. O exército da cruz vermelha se mobilizou. Os oficiais da fronteira trabalham noite e dia para remediar essa “crise” que vocês provocaram. E depois de tudo isso, você ainda vem criticar a nossa atitude?

Talvez um simples “obrigado” tivesse sido melhor.

Explicando o contexto

O texto acima foi publicado no Journal de Montréal, pelo jornalista Richard Martineau, e reflete um pouco da reação dos canadenses quanto à chegada dos haitianos às fronteiras canadenses.

Na data de publicação deste artigo, entre 1000 e 1200 pessoas aguardavam liberação dos oficiais de imigração do Canadá na cidade de Saint-Bernard-de-Lacolle. O exército do Canadá instalou tendas para atender essas pessoas, mas há espaço para no máximo 700. Muitos acabam se espremendo como podem em busca de abrigo.

Muitas dessas pessoas em espera possuem um bom nível de qualificação profissional. Existem enfermeiros, empresários, professores, etc., todos já adaptados ao meio de vida norte americano, afirma Marleine Bastien, diretora do organismo Fanm Ayisyen Nan Miyami, inc.

No total, 300.000 pessoas estão sob risco de serem deportadas.

O general John Kelly, secretário de segurança interna dos Estados Unidos, anunciará do próximo dia 22 de novembro a suspensão de vistos temporários para haitianos.

Texto original de Richard Martineau para o Journal de Montréal.