Projeto Canadá em família: separar para imigrar é a solução?
Como já contei aqui, eu vim sozinha para o Canadá com meus dois filhos, enquanto meu marido continua trabalhando no Brasil. Em função disso, é muito comum algumas pessoas virem pedir minha opinião para questões do tipo: “Somos um casal com filhos e não temos dinheiro suficiente para imigrar. Devo imigrar sozinha(o)?” Em outras palavras: será que separar a família, ainda que temporariamente, para viabilizar um projeto de imigração, é a solução?
Como tudo nesta vida, há prós e contras nesta decisão. E, bem honestamente, digo que há mais contras do que prós. Eu tomei a decisão de vir sozinha porque era a minha única alternativa. A decisão de emigrarmos para outro país havia sido tomada em conjunto, no início de 2014. Entretanto, na hora de executar o plano, 1 ano e meio depois, eu fiquei sabendo que teria que fazê-lo sozinha. E aí eu tive que escolher: ou eu vinha sozinha ou eu não viria nunca.
Considerando-se as duas alternativas disponíveis, tomei coragem e vim, já que ficar no Brasil não era alternativa para mim naquele momento. No entanto, não consigo me sentir confortável para recomendar a ninguém que faça o mesmo. Não acredito que separar a família temporariamente em função de um projeto de imigração seja a decisão mais inteligente. Acho que este é um caminho que devemos seguir somente se não tivermos realmente outra alternativa.
Os prós
Vou começar pelos prós, já que eles são poucos. O primeiro deles é, com certeza, o forte vínculo que você vai manter com o seu país de origem. Isso é importante para quem pretende vir para o Canadá para estudar. Como se sabe, o visto de estudos tem caráter de residência temporária. Por isso, todo aplicante deve comprovar que pretende voltar ao país de origem ao término dos seus estudos. Ter o cônjuge morando ainda em seu país de origem é um forte vínculo que você poderá comprovar na sua aplicação. E caso algo dê errado por aqui, caso você não se adapte, sua casa vai estar montada no Brasil, de braços abertos, esperando por você.
Outro fator positivo é a comprovação financeira: você terá que comprovar um valor menor para fins de estudos e moradia. Além disso, o cônjuge que fica no Brasil poderá enviar dinheiro mensalmente para as despesas aqui no Canadá. Com este suporte financeiro extra, você poderá ficar mais tranquilo em relação às despesas que terá quando chegar aqui. E logo aviso: por mais que você planeje, é fato que você vai gastar mais do que previu.
Um último pró é a “segurança” que você terá por saber que, se precisar, você pode voltar ao Brasil a qualquer momento. Essa “segurança” é assim, entre aspas, porque o fato de estar aqui totalmente sozinho, principalmente se vier com filhos, vai te deixar inseguro em diversos momentos. Acaba que a segurança de ter um backup no Brasil, não se traduz efetivamente em segurança para você aqui.
Os contras
Os contras são muitos, claro. Principalmente se você vier com filhos, há uma série de coisas a se levar em consideração. No caso de esta ser sua única alternativa, eu diria para fazer como alguns amigos meus fizeram: venha sozinho. Nesta primeira etapa, deixe os filhos no Brasil.
Por que digo isso? Porque os desafios são imensos. Conciliar rotina de estudos, aulas no College e ainda dar atenção aos filhos, fazer compras, cozinhar, organizar a casa, lavar a roupa (de todos!), é muita coisa para uma pessoa só. Já contei como é essa loucura toda neste post aqui. E eu vou ser bem honesta com vocês: eu sou uma pessoa muito produtiva, muito focada, muito organizada. Ainda assim, eu tive que elevar minha capacidade de gerenciamento de tempo a níveis extremos para conseguir dar conta das coisas. Acredite: não é fácil. Esta semana, ouvi da própria coordenadora do meu curso no College: “Andrea… realmente não sei como é que você consegue dar conta de tudo”. Eu confesso que eu própria também não sei. Acho que é a falta de opção que me faz conseguir. Quando a gente não tem escolha, a gente vai e faz.
Para manter a sanidade mental no meio desta rotina alucinante, eu me mantenho firme na minha prática de meditação, que faço já desde 2014. Fora isso, mantenho minha rotina de exercícios, que também é fundamental para que eu me equilibre emocionalmente.
Claro que, se você optar por vir sem os filhos, sentirá muita falta deles. Mas se você vier sozinho, você poderá fazer algumas visitas a eles durante as férias do seu curso. Já quando você vem com os filhos, os custos de uma viagem ao Brasil são bem maiores.
Outra coisa importante a ser mencionada é que meus filhos estavam com 7 e 9 anos quando viemos para cá. Nesta idade, a criança já tem uma boa independência e faz muitas coisas sozinha. Muito importante: eles já podem ajudar em inúmeras tarefas da casa. Já me perguntaram sobre vir com bebês, ou com crianças na faixa de 4 anos de idade. Bem honestamente: acho bastante complicado. Será necessário ter uma pessoa para ajudar na maior parte do tempo, para que sobre tempo para estudar. Isso significa ter um gasto extra considerável. Se o casal resolveu fazer o processo separadamente por questões financeiras, como poderá arcar com estes custos?
E já que estamos falando em custos… Manter duas casas, uma no Brasil e outra no Canadá, fica bastante caro. Fora isso, quem ficar no Brasil virá (ou deveria vir) algumas vezes por ano para visitar a família que está no Canadá. De novo, mais gastos. E com isso a “vantagem” financeira de imigrar separadamente vai embora pelo ralo.
Menos possibilidades de pontuação no Express Entry
Em relação ao processo de imigração em si, há mais uma desvantagem que vale a pena mencionar: se você vem sozinho, o cônjuge que fica no Brasil perde a oportunidade de trabalhar aqui em um emprego full time para somar pontos para aplicar para o Express Entry. No meu caso, se meu marido estivesse trabalhando aqui, quando completasse 1 ano de trabalho ele já teria pontos suficientes para ser chamado pelo Express Entry, de acordo com as pontuações dos últimos rounds of invitations. Se ele tivesse vindo, teríamos a chance de aplicar para o Express Entry antes mesmo de meu curso terminar. Estou considerando, neste caso, que seria possível conseguir emprego ao menos no NOC B para poder pontuar para o Express Entry. Uma excelente nota no IELTS também seria necessária, mas isso é totalmente factível se a pessoa se dedicar e estudar para a prova.
A falta que os filhos sentirão de um dos pais
E por último, a maior e mais óbvia desvantagem de todas, no meu ver: a separação temporária da família. Minhas crianças são tranquilas e fáceis de lidar. Não posso dizer que eles tenham me dado trabalho aqui. A fase de adaptação na escola foi bastante tranquila. Claro, durante todo este tempo, eles sentiram falta do pai, mas não chegaram a ter problemas de comportamento ou crises de choro por causa disso. A gente sempre tenta suprir a ausência conversando pelo Skype. Não é a mesma coisa, mas ajuda.
No entanto, chegou um momento em que eles meio que se cansaram de esperar o pai vir e começaram a cobrar mais: “Puxa, quando é que o papai vem? ” Eu, infelizmente, nada posso fazer em relação a isso, a não ser pedir paciência a eles e explicar que é necessário esperar um pouco mais. Claro que eu gostaria que a família estivesse aqui reunida, mas infelizmente isso não depende apenas de mim. A minha escolha, desde o início, foi que a família viesse toda junta, porque é isso que eu acho mais adequado.
Será que vale a pena mesmo separar a família para imigrar?
Por tudo isso, quando alguém me pergunta se eu acho que a pessoa deve vir sozinha com os filhos, eu não consigo me sentir confortável para incentivar a pessoa a fazer isso. Até porque eu me conheço e calculei muito bem o tamanho do passo que eu iria dar. Já, quando alguém me pergunta, eu tenho receio de falar para a pessoa vir, porque na maioria das vezes eu não conheço suficientemente a pessoa para poder dar uma opinião destas na vida dela.
Muitos que me perguntam, dizem: “é que eu gostaria de ir agora, mas nós só teremos dinheiro para irmos todos juntos daqui a 1 ano (ou 2 ou 3…).” Eu acho que se o casal tem a opção de continuar no Brasil, trabalhando e guardando dinheiro para vir dentro de alguns anos, essa é o melhor caminho a seguir. Imigrar nunca é fácil. Abandonar a vida que se construiu em um país, para começar praticamente do zero em outro, demanda muita energia e dedicação. Resiliência, flexibilidade e determinação também são fundamentais. Então, para que tornar mais difícil aquilo que por si só já é um grande desafio?
Um esclarecimento
Só para esclarecer: não me refiro aos casos de pessoas que decidem vir sozinhas 2 ou 3 meses antes, seja para fazer um curso de inglês ou para procurar imóvel e organizar a casa aqui antes do restante da família vir. Estou falando de separações longas, de mais de 1 ano, que são mais difíceis. Um dos dois vir antes para organizar tudo pode até ser melhor, pois é bem mais fácil fazer isso sozinho do que com crianças a tiracolo.
Vejam: minha intenção não é desmotivar ninguém. Pelo contrário: minha intenção é fornecer mais elementos para que as pessoas possam levar em conta na sua tomada de decisão. Quanto mais abrangente e racional for a sua análise, maiores as chances de sucesso do seu projeto de imigração.
Com a família unida é muito melhor!
A família decidiu imigrar? Venham todos os juntos! Planejem, guardem dinheiro, estudem. Acima de tudo, tenham paciência! Mudar de país não é uma coisa que se faz da noite para o dia. É um projeto que tem que ser planejado e executado cuidadosamente e que demanda tempo. Por isso, não tenha pressa. Não faça com que a sua impaciência bote tudo a perder. Com o devido planejamento, logo o seu plano estará em execução e você poderá vir com toda a sua família. E aí, garanto a você: será muito mais gostoso e gratificante poder curtir esta conquista com a família toda unida!
E você? Conhece alguma família que optou por emigrar separadamente? Você que é casado(a), já considerou esta possibilidade para sua família? Decidiram vir juntos ou separados? O que os levou a tomar esta decisão? Conte para gente!
Créditos da imagem: Mirror